Reflexão Ideológica

09 janeiro 2009

HERMENÊUTICA E ACONSELHAMENTO

ALGUMAS IMPLICAÇÕES DA HERMENÊUTICA NO PROCESSO DE ACONSELHAMENTO

Hermenêutica é uma disciplina presente em todos os campos da existência humana e, portanto, não poderia ser diferente no que se refere ao processo de aconselhamento. Há, porém, um fator de fundamental importância nisso: “o para que” e o “para quem” do processo.
Se percebermos a hermenêutica como uma forma de trazer à compreensão algo que estava incompreendido, precisamos, então, observar quem são os atores e quais os seus papéis no processo de aconselhamento e o que se deseja alcançar como objetivo.
A fonte da mensagem proferida será sempre o(s) aconselhando(s) ou aconselhanda(s). O alvo, num primeiro momento, é o conselheiro ou conselheira, contudo, o processo termina na própria fonte, pois o seu para quem é ela e o para que é o seu crescimento.
Nesse sentido, o conteúdo dito pela fonte precisará ser esclarecido para que ela própria perceba o conteúdo que está explícito ou implícito em sua fala e novas conclusões sejam alcançadas.
Dizer o que está experimentando, incluindo aí todas as nuances conscientes e ou inconscientes, é a mensagem e ao mesmo tempo a primeira parte do processo hermenêutico que a própria fonte começa estabelecer e necessariamente precisará fazê-lo.
Explicar o que está dizendo não será exercício apenas do ouvinte ou da ouvinte, mas principalmente um exercício da fonte para si mesmo, pois esse passo conduzirá, com a clarificação ou só com a presença silenciosa do ouvinte ou da ouvinte, ao terceiro passo que é a tradução daquilo que foi dito, pois agora as palavras podem ser “ouvidas” de novo, já que foram expressas.
Quando o conselheiro ou conselheira assume uma função hermenêutica e devolve o processo dizendo e explicando o que se traduziu um enorme risco se estabelece. Todo o conteúdo expresso já pode vir limitado por todas as repressões e auto proteções naturais de quem o expressou, além disso, o conselheiro ou conselheira corre o risco de compreender a mensagem de acordo com sua história, tradução ou conveniência pessoal.
Obviamente que, tecnicamente, o conselheiro ou conselheira também estará desenvolvendo um processo hermenêutico, pois aquelas palavras reverberam em sua própria pessoa, porém, o alvo não está em si e sim no aconselhando ou aconselhanda. Quando isso ocorre, as conclusões chegadas podem ter muita significância, significância, alguma significância ou absolutamente nenhuma significância.
Quando se entende o papel do conselheiro ou conselheira como facilitador ou facilitadora de uma melhor auto percepção e auto compreensão do aconselhando ou aconselhanda, uma parte do diálogo, e não como Hermes, como aquele ou aquela que traz a explicação, o aconselhamento ganha um sentido mais dialogal do que responsivo, mais de troca do que de venda ou doação de uma compreensão.
Em Aconselhamento, então, a hermenêutica acontece nos dois lados dos envolvidos, entretanto, o alvo é o aconselhando ou aconselhanda e não o conselheiro ou conselheira.
O “para que”, então, não está preso ao interesse do hermeneuta-ouvinte e sim do hermeneuta-falante. O primeiro funciona apenas como espelho do segundo, que lhe permite interpretar ou que foi dito, explicado e traduzido a si mesmo ou si mesma, com o propósito de gerar em si uma melhor compreensão de sua própria vivência e experienciar o que foi trazido ao ambiente de aconselhamento.
O conteúdo recebido pelo ouvinte também poderá servir para uma outra reflexão que se abre a partir daí: o conteúdo explicitado pela fonte original pode mexer com os próprios conteúdos do conselheiro ou conselheira e gerar auto falas, auto explicações e auto compreensões que mexem com sua própria existência, mas que não podem, nem de longe, serem trazidas para aquele espaço, pois o alvo não é a fonte.
Desse modo, hermenêutica existe como disciplina no processo de aconselhamento, contudo, assume contornos que precisam ser entendidos de modo muito próprio para aquela situação e para aquele ambiente.